"Somente nos relatórios de Marco Polo, Kublai Khan conseguia discernir, através das muralhas e das torres destinadas a desmoronar, a filigrana de um desenho tão fino a ponto de evitar as mordidas dos cupins"
Ítalo Calvino, As cidades invisiveis

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

As Cidades e os Sonhos 3: Atenas

Diz a lenda que dois deuses disputaram entre si pelo domínio da Ática: Posseidon, Deus dos Mares, bateu com seu tridente no solo árido e fez brotar uma fonte de águas límpidas. Atena, Deusa da Sabedoria e da Justiça, fez brotar da terra uma oliveira. Os homens da cidade favoreceram Posseidon, mas as mulheres, que eram maioria, elegeram Atena como sua patrona. Desde então a cidade recebeu da deusa virgem seu nome e sua proteção, além do privilégio, entre outras cidades gregas, de crescer com a graça e a força que lhe foram particulares. Os helenos se viram obrigados a disputar o controle da cidade com outros povos, e por isso sucessivas guerras e disputas assolaram Atenas, desde a contenda primeva entre os imortais.

E se começo este relato contando a história da cidade é porque não há como olhar para Atenas sem enxergar seu passado ilustre. Durante eras incontáveis Atenas foi, como a deusa da qual recebeu o nome e a benção, um farol da ciência, do progresso, da sabedoria e da inovação humana. Pelas ruas de Atenas já caminharam os pés dos filósofos que tentaram desvendar os mistérios do homem, dos matemáticos que traçavam nas areias os teoremas que buscavam explicar a natureza, dos políticos que aprenderam que o domínio da palavra pode ser tão poderoso quanto o da espada, dos astrônomos que traçavam rotas precisas entre as estrelas... Atenas foi berço de homens e mulheres que, com suas paixões e desejos, moldaram séculos de história, a mesma história que a cidade exibe em mármore e pedaços de cerâmica. E a beleza de Atenas jaz justamente em sua capacidade de contar a longa história de progresso, de choques, de amores e de opressão da qual fez parte, e que se desenrola até hoje. Se sonho com Atenas é como se eu tentasse abarcar de uma só vez o passado, o presente e o futuro, e quanto sonho com Atenas é impossível dizer se fantasio, ou se apenas relembro frases e feitos que estão há muito enterrados, como a própria cidade, que cresce eternamente sobre as ruínas de uma era e uma cidade anterior.

E se sonho com Atenas talvez seja porque quero preservar seus encantos, e reconciliar passado e presente, e por isso mesclo a memória e o desejo, e na minha imaginação Atenas existe simultaneamente como a cidade moderna que se ergue sobre a ruína e a cidade passada, perdida e jamais reencontrada, onde Atena e Posseidon travaram seu duelo. É de se esperar que um dia Atenas desaparecerá, sugada no vórtice que um dia irá devorar nossa galáxia quando todas as estrelas colidirem, mas a memória de Atenas sobreviverá na fantasia, e se alimentará da matéria dos sonhos.

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

As cidades e o Tempo 1: Heliodora

Atravessa-se lagos, rios e pastos: finalmente o olhar do viajante atinge Heliodora. Não há nada de particular a respeito de Heliodora, magnânimo Kublai: a cidade é pequena, aconchegante, e até dotada de certo encanto bucólico. Tem uns tantos pontos turísticos, e uns tantos feriados em que se comemora o aniversário dos fundadores, os dias de santos, as festas populares. Até aí, nada existe que a diferencie de outras cidades do império. Mas Heliodora possui uma particularidade, que é a de permanecer imutável no tempo e no espaço. Quando os filhos de Heliodora crescem, mudam-se para cidades maiores e mais prósperas, onde trabalham à exaustão para acumular dinheiro. Em certo ponto, sentem a necessidade de casar e ter filhos, e quando isso acontece é preciso cumprir o ritual de retornar à Heliodora para levar os rebentos para serem devidamente analisados e abençoados pelos mais velhos...

E, a despeito de quanto tempo tenha se passado, quando os filhos ausentes retornarem à Heliodora eles a encontrarão da mesma maneira que a deixaram, e a onda de nostalgia que envolve a atmosfera da cidade trará uma série infindável de reminiscências. Em algum ponto, inevitavelmente, irão se perguntar se faz mesmo tanto tempo que deixaram a cidade, e quase se sentirão transportados novamente aos dias de outrora. Então sentir-se-ão felizes por ver que Heliodora ainda é o mesmo lugar, que traz à mente as mesmas memórias, imagens e sensações, como se a própria cidade fosse um pedaço do passado, um passado tão vivo e pulsante que quase se pode guardá-lo no bolso, para se lembrar dele mais tarde. Quando retornarem às suas casas, nas grandes cidades, cidades prósperas, as reminiscências serão substituídas pelas obrigações do presente: o estudo, o trabalho, as contas, e em poucos dias esse passado será esquecido, como se nunca tivesse existido.

Mas então chegará o momento de voltar à Heliodora, e quando isso acontecer as mesmas lembranças estarão lá, à espera e então o passado que a cidade evoca, que está contido em seu presente, novamente irá assediá-los. Há quem diga que Heliodora, cidade que jamais envelhece, irá sobreviver ao colapso de todas as outras cidades do mundo, até que esta finalmente irá se desfazer depois que o tempo houver devorado todo o resto.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

As Cidades e o Caos 2: Una

A cidade de Una, tal como existe hoje, nasceu, dizem os mais sábios, após 100 anos de conflitos entre duas castas. Começou da seguinte forma: dois grupos de homens, vindos de direções diferentes, encontraram-se no mesmo local. Um dos grupos, formado por negociantes, cercou uma porção de terra e disse: "é nosso". O outro grupo, formado por homens letrados, construiu uma cerca maior, que englobava o círculo original e disse: "é nosso". O enfrentamento desses grupos, ao longo dos séculos, estabeleceu a morfologia da cidade: esta consiste em dezenas de círculos perfeitamente concêntricos, estruturados simetricamente, atravessados por pontes, vias expressas e passarelas, que formam um desenho complexo, porém perfeitamente ordenado, tendo como ponto de partida a cerca inicial. O conflito acabou quando a cidade atingiu o limite de sua expansão, não sendo mais possível construir além da última muralha, feita pelos letrados. Impossibilitados de prosseguir com o feudo, negociantes e letrados fizeram um acordo, e a cidade de Una passou a ser habitada conjuntamente pelas duas castas, porém em rigorosa separação.

Como resultado desse processo, Una apresenta-se dúbia e desigual no tempo e no espaço: leis severas regem o usufruto da terra, e o rodízio das pontes e passarelas, e é estritamente proibido o transpasse dos círculos, apenas acessíveis aos membros da casta que os construiu. Um negociante pode nascer, crescer, casar-se, envelhecer e morrer sem conhecer as maravilhas que, diz-se, podem ser encontradas nos círculos dos letrados: a torre de bronze e vidro, A Universiade, o Planetário, a Biblioteca, o aquário de golfinhos, o Museu. Por outro lado, nem mesmo o mais velho dos letrados pode dizer como é o Bazar de tendas multicoloridas, a Estação de trem, o Palácio dos Ourives, o Banco, a Feira, a Rua das Tapeçarias. Diz-se que, nos tempos antigos, a punição para o transpasse era a morte, punição abrandada, nos tempos modernos, e substituída pelo exílio. Como resultado, a cidade de Una esvazia-se cada vez mais, à medida que a curiosidade dos jovens os compele a questionar o propósito de sua criação desigual, e transgredir o limite dos círculos nativos. Os que por acaso chegam à Una pela primeira vez são rigorosamente questionados e classificados de acordo com a divisão de castas e, podendo conhecer apenas um dos aspectos da cidade dupla, decidem seguir viagem, decepcionados por terem visto tão pouco.

Recentemente, quando questionados sobre o motivo que os levava a manter a cidade de Una rigorosamente segregada, negociantes e letrados foram unânimes em afirmar: "Se abolirmos as normas e permitirmos que as castas se misturem, a cidade de Una logo será dominada pelo caos que se alastra pelas outras cidades do Império, e deixará de existir. Nós a construímos de forma ordenada, de modo a não permitir nenhum tipo de mistura entre as castas. Na uniformidade está a ordem, na diversidade está o caos." Mas, se me permite dizer, magnânimo imperador, tanto os negociantes quanto os letrados ignoram um fato importantíssimo: que o caos que temem é a substância que dá vida às cidades, a diversidade que desprezam é o combustível da inovação, e a ordem nada mais é do que uma fantasia. Como ignoram essas coisas, seus habitantes não sabem que Una, a cidade dupla condenada a uma meia-vida, está destinada a desaparecer.

terça-feira, 4 de junho de 2013

As Cidades e o Caos 1: Alina


Entre montanhas escarpadas, assentada em um profundo vale está Alina, cidade dos mais diversos sons. Seria impossível passar por esta cidade e não ser tocado pela confusão que cerca suas ruas e avenidas. Vias estreitas, veículos incaláveis, centenas de pessoas se acotovelando nas ruas, sem ao menos se cumprimentar. Poder-se-ia dizer que as sirenes se assemelham a gritos de socorro. Durante o dia as calçadas se enchem de pessoas e as ruas de veículos gerando um burburinho insuportável, mas que é impossível evitar. Caminhando pelas ruas é preciso não dar atenção aos olhares tortos e palavras ríspidas, e, ao mesmo tempo, ficar atento para não ser surpreendido pelos ladrões, que correm entre a multidão como ratos assustados. Quando a noite cai, surgem outras personagens em cena, e a cidade se enche de outros sons: risos, música, gritos, exclamações e impropérios que rompem a calada da noite. É a vez dos bêbados, vândalos, libertinos, suicidas, desesperados... A cidade ganha um aspecto novo, e torna-se um novo palco para o espetáculo da lascívia, da balbúrdia, do tumulto...

Em meio a tanta confusão, é difícil dizer o que é normal e o que não é: o caos do dia e da noite se misturam, se somam e se multiplicam, formando um conjunto aparentemente indecifrável de sons e imagens , algumas perturbadoras. Mas se engana quem pensa que conhece Alina por esses dois aspectos. Quem tem a oportunidade de visitar a cidade no começo da manhã, quando o céu ainda está escuro, mas o sol nascente já derrama no horizonte reflexos de um rosa pálido, esbarra em outra cidade, é surpreendido por outros sons: o assovio cadenciado do trabalhador, que se arrasta para a fábrica, o riso das crianças que, em fila, atravessam as ruas até a escola, a canção do padeiro, e o bom dia cantado, com sorriso franco, pela lavadeira...

Alina, cidade caótica, é chamada por alguns a “Princesa do Império”: há quem discorde, mas quem disse que a beleza é composta apenas de perfeição?

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

As Cidades Possíveis 2: Alethea

Algumas cidades vivem de seu passado memorável. Ostentam palácios de mármore, teatros de metal e vidro, aquedutos, museus, como se fossem as fotos em preto e branco de um álbum de família, pérolas de um tempo pretérito cheio de louros e grandeza e opulência...

Assim também é Alethea... A cidade viveu um passado rico, quando era então a grande metrópole para onde convergiam os olhares e atenções. A Alethea de então pululava de fábricas, de riqueza e progresso: as mercadorias circulavam, e tudo parecia brilhar com o ouro que brotava, e as damas usavam vestidos de seda riquíssima e os cavalheiros cumprimentavam tirando o chapéu.

Mas esse tempo se foi, e os palácios, teatros, aquedutos e museus, restos de pedra e mármore de um tempo de grandeza, jazem esquecidos: as fábricas fecharam, a cidade que antes era farol hoje vive se amargurando, quando se compara às metrópoles, pobres à sua época de ouro, e que hoje crescem e se inflam e ocupam os espaços vazios... E considerando-se a cidade mais feia, mais suja, mais pobre, mais violenta, presa a esses rótulos, e assombrada pelos feitos de um passado distante, Alethea impede a si mesma de florescer, e se obriga a ser sempre mais no menos.

Longe de seu passado glorioso, a cidade aparece aos olhos de seus habitantes como um receptáculo de tudo o que é ruim, pequeno, feio, medíocre, ou menos, e menos ainda. E enquanto olham para trás e contemplam as glórias perdidas, e olham para longe e contemplam as cidades que espelham o que Alethea poderia ter sido (e não foi), seus habitantes não se dão conta da cidade em que vivem, e não são capazes de enxergar as ruas cinzentas por onde caminham, as torres que se erguem contra o perfil montanhoso, as galerias que cortam sua compacidade de concreto e aço, as antenas dos pára-raios que irrompem dos altos edifícios, as multidões que se abrigam da chuva nos pontos de ônibus, como formigas. Presos ao passado, não se dão conta de que a cidade cresce no presente, ainda que amorfa e desordenadamente, mas cresce, e se concretiza, e quem sabe quando atingirá o céu?

Embora Alethea pareça, à primeira vista, apenas uma coleção de fragmentos de memória, cacos dourados de um passado opulento misturados a peças de latão, cascas de frutas, latas de lixo, folhas secas, de fato a cidade possui dentro de si um vir-a-ser. No entanto, não sabem os seus habitantes que a Alethea futura, esta que aguarda o momento propício para despontar, não é espelho de seu passado ilustre. A Alethea vindoura não guarda semelhança alguma com os fragmentos esparsos de seu ontem, mas brilha de nova acumulando torres compactas de concreto e vidro, galerias, antenas de pára-raios, e ruas cinzentas. Este é o gérmen de uma cidade magnífica, encasulado na cidade dourada, translúcida e sem espessura, que aguarda o momento de sua libertação...

As Cidades Possíveis 1: Lira

Caminhando-se por vários dias em direção ao sul, atravessa-se cadeias de montanhas, lagos congelados, savanas e desertos. Finalmente o viajante atinge Lira, cidade cinza de concreto e pedra. Não que existam muitos atrativos em Lira que compensem a difícil travessia. Na verdade, a cidade é feia e apagada, não possuindo qualquer tipo de beleza ou particularidade que a torne memorável: a praça é um amontoado de bancos de concreto cinza, árvores esparsas, lampiões cobertos de ferrugem... A igreja, com a pintura descascada, é idêntica a milhares de outras igrejas, comum e simplória, como tudo na cidade. Os subúrbios são os mesmos, e os rostos e sotaques idênticos a uma série de rostos e sotaques que se encontra em dezenas de outras cidades. Não, Lira não possui nenhum tipo de singularidade que a qualifique como magnífica. A população, empenhada em acumular dinheiro, trabalha durante todo o dia, até mesmo nos feriados. Não existem dias de descanso, ou dias de lazer, não existem datas comemorativas. Das janelas dos escritórios ouve-se o barulho repetido dos dedos metralhando máquinas de escrever e computadores, e dos telefones tocando... Das janelas das casas, à noite, pode-se ver a luz azulada que vêm do televisor, onde os mesmos programas se repetem dia após dia. Em Lira parece existir uma onda de avareza e egoísmo, de mau-humor e tédio, de ódio e asco, e todos os dias milhares de sonâmbulos percorrem as ruas cinzentas de Lira, da casa para o trabalho, e do trabalho para casa, e da casa para o trabalho de novo, e de novo, e de novo... A cidade parece envolvida por uma constante letargia: em Lira nada cresce, nada brilha, nada germina, é sempre concreto contra concreto, cinza contra cinza...

A razão de descrevê-la é que, mesmo em meio à desinteressante profusão de muros e praças e ruas e casas, às vezes algo de inconfundivelmente lindo e singular parece brotar, em meio à feiúra sempre-cinza de Lira, como uma flor tardia, tímida e pequena, até mesmo pálida, mas ainda assim... É apenas uma sensação, um pressentimento, de que em meio ao cinza dos muros, em meio ao egoísmo e ao mau-humor das pessoas que passam, caras fechadas, fechados em seus sobretudos escuros, existe outra Lira, magnífica, dourada e resplandecente, um amálgama de todas as coisas boas, das virtudes mais elevadas, dos sentimentos mais puros... É um sentimento estranho e inexplicavelmente bom, que aflora quando se vê, em meio à amplitude de torres de aço e vidro, um pássaro azul voando livre contra o céu cinzento, ou um resiliente raio de sol furando a espessa camada de fumaça que envolve a atmosfera, ou um cão feliz roendo um pedaço de pão encontrado no lixo, ou ainda quando se vê um grito de liberdade e revolução escrito em vermelho nos muros de pedra.

Por isso, quando ouvir notícias de Lira, lembre-se, desavisado viajante, não da cidade feia e comum, de pedra, concreto, cinza e tédio, mas da Lira de flores, pássaros, raios de sol e gritos de liberdade. Quando pensar em Lira, não pense na cidade real, que se espalha sobre o solo arenoso, mas na cidade possível, uma flor pálida que brota no fundo da mente humana, mas cresce e cresce e cresce, e se expande, e se dilata...

As Cidades e os Sonhos 2: Veneza

Sonho com muitas cidades. Cidades grandes e pequenas, reais e imaginárias, cidades belas e feias, cidades de pedra ou cidades leves, de “espessura opaca e fictícia”. As cidades com que sonho fazem-se a si mesmas, reúnem-se em um colar como contas de âmbar, cidades inumeráveis, cada qual com sua particularidade. Entretanto, de todas as cidades sonhadas, belas ou feias, brilhantes ou caóticas, ilustres ou desconhecidas, nenhuma jamais conseguiu me encantar tanto quanto uma pequena cidade aquática chamada Veneza. Os canais de Veneza canalizam meus desejos e fantasias, atraem meus olhares, prendem minha atenção, tiram-me o fôlego, e por mais que eu tente é impossível escapar desse encanto... Por mais que meus desejos me levem a outras cidades, por mais que sonhe com a delirante Nova York, com a imperiosa Roma, com a velha Londres, com a sedutora Paris, quando estou feliz e desatento, quando respiro a brisa do começo de primavera e o ar traz o aroma de frutas maduras, quando fecho os olhos em meio ao barulho, à fumaça, à fuligem e à feiúra, e por um momento estou em paz, sinto-me imediatamente em Veneza, caminhando pelas pedras lodosas de Veneza, ou deslizando de gôndola pelos canais de Veneza, ou observando os canais debruçado sobre os balcões dos palácios de Veneza, e não importa onde eu realmente esteja, não importam o barulho, a fumaça, a fuligem, a feiúra, os assaltos, as fofocas, não me importa nada, porque naquele momento, olhos fechados e coração em calma, estou em Veneza, e tudo o que vejo, ouço, sinto e respiro é Veneza...

Do lado de fora das minhas pálpebras ainda existem o barulho, a fuligem, e a feiúra, mas com os olhos fechados, nada parece mais real do que residir no encanto de Veneza. Por mais estranho e impossível que pareça, espero ainda pelo dia em que se produzirá o fenômeno inverso. Por isso, continuo a fechar minhas pálpebras em meio à fuligem e à feiúra, em meio ao barulho e à náusea, aguardando sempre pelo dia em que, ao abrir os olhos, a realidade me trará Veneza.